27.6.08

100 anos de Guimarães Rosa

Tem horas antigas que ficaram muito mais perto
da gente do que outras, de recente data.

[João Guimarães Rosa]

25.6.08

Que mundo estranho seria este se todos tivéssemos o mesmo senso de humor...

[Bern Williams]

24.6.08

Não quero ser o último a comer-te

Não quero ser o último a comer-te.
Se em tempo não ousei, agora é tarde.
Nem sopra a flama antiga nem beber-te
aplacaria sede que não arde
em minha boca seca de querer-te,
de desejar-te tanto e sem alarde,
fome que não sofria padecer-te
assim pasto de tantos, e eu covarde
a esperar que limpasses toda a gala
que por teu corpo e alma ainda resvala,
e chegasses, intacta, renascida,
para travar comigo a luta extrema
que fizesse de toda a nossa vida
um chamejante, universal poema.


[Não quero ser o último a comer-te, Carlos Drummond de Andrade]

23.6.08

Já senti tantos acessos de alegria e tristeza, que nunca mais
me deixarei ingenuamente arrastar por elas à primeira vista.

[Shakespeare]

22.6.08

Quero apenas cinco coisas:
Primeiro é o amor sem fim
A segunda é ver o outono
A terceira é o grave inverno
Em quarto lugar o verão
A quinta coisa são teus olhos
Não quero dormir sem teus olhos.
Não quero ser... sem que me olhes.
Abro mão da primavera para que continues me olhando.

[Pablo Neruda]

21.6.08

Acorrentados

Quem coleciona selos para o filho do amigo; quem acorda de madrugada e estremece no desgosto de si mesmo ao lembrar que há muitos anos feriu a quem amava; quem chora no cinema ao ver o reencontro de pai e filho; quem segura sem temor uma lagartixa e lhe faz com os dedos uma carícia; quem se detém no caminho para ver melhor a flor silvestre; quem se ri das próprias rugas; quem decide aplicar-se ao estudo de uma língua morta depois de um fracasso sentimental; quem procura na cidade os traços da cidade que passou; quem se deixa tocar pelo símbolo da porta fechada; quem costura roupa para os lázaros; quem envia bonecas às filhas dos lázaros; quem diz a uma visita pouco familiar: Meu pai só gostava desta cadeira; quem manda livros aos presidiários; quem se comove ao ver passar de cabeça branca aquele ou aquela, mestre ou mestra, que foi a fera do colégio; quem escolhe na venda verdura fresca para o canário; quem se lembra todos os dias do amigo morto; quem jamais negligencia os ritos da amizade; quem guarda, se lhe deram de presente, o isqueiro que não mais funciona; quem, não tendo o hábito de beber, liga o telefone internacional no segundo uísque a fim de conversar com amigo ou amiga; quem coleciona pedras, garrafas e galhos ressequidos; quem passa mais de dez minutos a fazer mágicas para as crianças; quem guarda as cartas do noivado com uma fita; quem sabe construir uma boa fogueira; quem entra em delicado transe diante dos velhos troncos, dos musgos e dos líquens; quem procura decifrar no desenho da madeira o hieróglifo da existência; quem não se acanha de achar o pôr-do-sol uma perfeição; quem se desata em sorriso à visão de uma cascata; quem leva a sério os transatlânticos que passam; quem visita sozinho os lugares onde já foi feliz ou infeliz; quem de repente liberta os pássaros do viveiro; quem sente pena da pessoa amada e não sabe explicar o motivo; quem julga adivinhar o pensamento do cavalo; todos eles são presidiários da ternura e andarão por toda a parte acorrentados, atados aos pequenos amores da armadilha terrestre.

[Acorrentados, Paulo Mendes Campos. Texto extraído do livro "O Anjo Bêbado"]

16.6.08

Um bom poema é aquele que nos dá a impressão
de que está lendo a gente... e não a gente a ele!

[Mario Quintana]

13.6.08

Nunca

Nunca

Nem que o mundo caia sobre mim

Nem se Deus mandar

Nem mesmo assim

As pazes contigo eu farei


Nunca

Quando a gente perde a ilusão

Deve sepultar o coração

Como eu sepultei


Saudade

Diga a esse moço por favor

Como foi sincero o meu amor

Quanto eu te adorei

Tempos atrás


Saudade

Não se esqueça também de dizer

Que é você quem me faz adormecer

Pra que eu viva em paz

[Lupicínio Rodrigues]

12.6.08

Escrevo-lhe pela última vez, e espero que você perceba – pela diferença de termos e de atitude desta carta – que você conseguiu enfim me convencer de que já não me ama, e de que, portanto, eu não devo mais amá-lo...

[Sóror Mariana Alcoforado 1640-1723, trecho de uma das cartas de amor de uma freira portuguesa a um oficial do exército francês]

11.6.08

Ah Maria

Eu queria falar com você
te dizer o que eu sentia
Ah, Maria! Maria!
Eu sei que você está
em algum lugar nessas ilhas

Eu queria viver com você
poder te ter todo dia
Ah, Maria! Maria!
Agora você vê
aquela estranha mesquita

O fim da tarde,
a água escura do mar
fica pra trás as sombras das ilhas
Ah, Maria, Maria!
Não te machuca os pés
andar descalça na rua?

Por trás do porto,
as igrejas e o céu
A noite, os rios e as outras meninas
Ah, Maria, Maria!
Será que você sorriu
lembrando daqueles dias?

O fim da tarde,
a água escura do mar
Por trás do porto,
as igrejas e o céu
Ah eu queria falar com você
Ah, Maria, Maria!

[Ah Maria, Paralamas do Sucesso]

7.6.08


Não fale, amor
Cada palavra, um beijo a menos.

[Dalton Trevisan]