19.11.15

Madrigal Melancólico

O que eu adoro em ti
Não é a tua beleza
A beleza é em nós que existe 
A beleza é um conceito
E a beleza é triste
Não é triste em si
Mas pelo que há nela
De fragilidade e incerteza 
O que eu adoro em ti
Não é a tua inteligência
Não é o teu espírito sutil
Tão ágil e tão luminoso
Ave solta no céu matinal da montanha
Nem é a tua ciência
Do coração dos homens e das coisas. 
O que eu adoro em ti
Não é a tua graça musical
Sucessiva e renovada a cada momento
Graça aérea como teu próprio momento
Graça que perturba e que satisfaz 
O que eu adoro em ti
Não é a mãe que já perdi
E nem meu pai 
O que eu adoro em tua natureza
Não é o profundo instinto matinal
Em teu flanco aberto como uma ferida
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza. 
O que adoro em ti lastima-me e consola-me:
O que eu adoro em ti é a vida!

[Manuel Bandeira]

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